"O que realmente abala, é saber que não são poucas as vezes em que as pessoas que essas mulheres amam e que acreditamos que as amam – os maridos, namorados, companheiros – rejeitam a fragilidade física e psicológica da mulher acometida pela doença e abandonam a raia."

Outubro foi o mês mundial da campanha contra o câncer de mama: o Outubro Rosa. A maior bandeira das campanhas contra o câncer de mama é a prevenção, pois as chances de cura crescem geometricamente quanto mais precoce for o diagnóstico. Além do auto-exame e consultas periódicas de revisão, a mamografia ainda é uma das ferramentas mais seguras de identificação de nódulos.

Rodam na Internet várias mensagens de e-mails com relatos, charges, piadas sobre a mamografia, que de fato é um exame bastante desconfortável para a esmagadora maioria das mulheres. E, nós, que já nos submetemos várias vezes ao dito cujo, não podemos deixar de rir e repassar as brincadeiras, afinal, se é inevitável, melhor rir e relaxar.

Em relação às mulheres que corajosamente contam suas histórias de diagnóstico, tratamento e vitória sobre o câncer de mama, o que mais choca não são os efeitos físicos e psicológicos que se sabe serem comuns. O medo, o sentimento de mutilação, a perda dos cabelos e de peso, a fragilidade, a auto-estima abalada, são consequências até certo ponto esperadas de um tratamento cirúrgico e quimioterápico, que via de regra é agressivo para que possa ser eficaz.

O que realmente abala, é saber que não são poucas as vezes em que as pessoas que essas mulheres amam e que acreditamos que as amam – os maridos, namorados, companheiros – rejeitam a fragilidade física e psicológica da mulher acometida pela doença e abandonam a raia. Em vez de serem apoio, estímulo, ajuda, tornam-se mais uma conseqüência, inesperada, dolorida e sofrida de um problema que por si só já seria difícil de enfrentar.

Ainda bem que nem sempre é assim. Conheço caso de homem que não só ficou com a mulher como continuou – e continua – amando-a intensamente, o que foi com certeza um fator fundamental para que ela tenha enfrentado da melhor maneira possível todo o tratamento, a remoção da mama, a peruca, e depois a prótese.

Em minha opinião, não é só uma questão de caráter o homem ficar ou sair correndo.
É, principalmente, o que essa pessoa entende por amor – e um reflexo do que a nossa sociedade entende por amor. A maioria das pessoas ainda não sabe, não aprendeu e talvez morram sem aprender, que amor é diferente de paixão. Que quando a gente está apaixonado, isso está diretamente ligado, totalmente indissociável da questão física, estética e química que aproxima dois seres. O que chamamos de paixão, é, nada mais, nada menos, do que instinto animal e química pura.

Já o amor, que pode ou não ser decorrente de paixão, transcende o físico, o estético e o químico. O amor se refere à personalidade, à maneira de ser e até ao caráter e ao intelecto do outro. Tem a ver com uma questão mais... espiritual – mas sem conotação religiosa. Independente da aparência, de ter todas as "partes", de o outro ser belo, elegante, magro, jovem, com ou sem rugas, com ou sem cabelos brancos, com ou sem barriga saliente, ama-se esse ser. E por ele somos capazes de enfrentar qualquer dor, qualquer sofrimento, se isso puder apoiá-lo e amenizar-lhe os maus momentos.

Infelizmente, não se vê isso com muita freqüência nos nossos dias. Estamos numa época em que o que é valorizado são as samambaias, melancias, melões e outras frutas e legumes. Em que as próteses para efeitos unicamente estéticos se proliferam, em que repuxamentos e preenchimentos no rosto e outros lugares, aspirações de gordura em todas as partes do corpo, malhação diária e controle nazista do peso para fazer do corpo uma escultura pela qual outras pessoas possam sentir paixão, é mais importante do que aprimorar o intelecto, polir o caráter, desvelar a verdadeira personalidade para que possa ser verdadeiramente amado.

Daí vêm as crises de depressão, a sensação de não ser valorizado, de ter uma vida vazia que tantas vezes acometem as pessoas quando se aproximam de uma idade madura. Já diz a antiga sabedoria popular, que só é possível colher aquilo que se plantou e cultivou. Se o cultivo foi do que é físico e material, que só tem valor de mercado e não possui valor intrínseco, na medida em que esse “produto” vence a validade, se deteriora ou perde a aparência de novo, ele deixa de ser importante para o consumidor e se aproxima a cada dia do momento de ser trocado por outro.

Acho que vale a pena começarmos a pensar sobre o que realmente tem valor na nossa vida, para podermos rever as atitudes que temos tomado nos últimos anos. Essa é forma de, quem sabe, prevenirmos um outro tipo de câncer, o das pessoas que fogem quando mais se precisa delas!

FONTE: Plena Mulher
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